Eu me sinto tão velho. Mas eu nunca me senti tão bem em toda minha vida, apesar das dores que sinto em todo o meu corpo, mas sei que é por causa da idade, então isso não importa. O dia hoje amanheceu muito bonito em Wallingford. O parque Bull Croft, olhando aqui da janela, parece bastante convidativo para uma caminhada, mas parece impossível quando você sente que suas pernas já não andam como deveriam. E por isso eu vou levando a vida aqui pela janela. Observando as pessoas passarem. Acho que eles não sabem viver a vida de forma correta. Eu queria estar no lugar delas, mas não poderia.
Minha neta
Molly Grace sempre vem me visitar. Na verdade, ela cuida de mim como se eu
fosse um bebê recém-nascido. Ela tem 19 anos e ainda está solteira. Pelo menos
é sempre isso que ela me diz. Sempre que pergunto sobre seus relacionamentos
ela sempre me responde que as pessoas hoje não levam mais nada a sério. E acho
que acredito nela. Acho que já esta quase na hora dela chegar inclusive.
Enquanto ela
não chega, observo a vida passar pela janela, e penso em algumas coisa que já
vivi e algumas coisas que eu gostaria de ter vivido com mais coragem. Só agora
percebo que errei e que o tempo não volta. Alguns arrependimentos me perseguem
quando repouso minha cabeça à noite, e se transformam em sonhos quando consigo
dormir. Quase sempre acordo no meio da noite chorando por ter sonhado com ele
mais uma vez, o horizonte.
Escuto a porta
se abrir de repente e continuo olhando pela janela, pois sei que é minha Neta
Molly.
– Eu disse pra você me esperar
chegar para que você não descesse as escadas sozinho vovó. - Molly, como
sempre com seus tons de preocupação, mas sempre falava comigo com uma voz
suave, mesmo que eu quebrasse alguma de suas regras.
– Desculpa Molly. Eu não resisto
deixar de ouvir os seus sermões. Você é uma menina boa que se preocupa comigo.
– Falei olhando em seus olhos. Lindos olhos azuis.
– Esta desculpado. Só me promete
que não fará mais isso. Se você caí escada a baixo, Deus me livre que isso
aconteça... Eu nem consigo imaginar isso. – Molly abria o restante das
cortinas da sala, e depois me olhou fixamente e perguntou com um sorriso entre
os lábios. – Já tomou café esta manhã? Senhor Charles Ross.
– Aceita me acompanhar Senhorita
Molly Grace? – Respondi também sorrindo.
Como
de costume em todas as manhãs, ela me levava até o meu quintal, onde eu poderia
ver a grama verde, as plantas, e as flores que minha falecida mulher plantou,
mas que ainda continuavam bonitas como sempre. Sentei-me em uma cadeira aconchegante
e pus meus óculos sobre a mesa. Logo depois Molly foi até a cozinha, fez um
chá, consegui ouvir o som do bule. Depois ela saiu pela porta dos fundos me
olhando com aquele olhar brilhante de sempre. Em suas mãos uma bandeja, com
frutas, biscoitos e pães. Molly sempre comprava pães todas as manhãs. E o bule
com o chá. Nos servimos e começamos a admirar a fonte no quintal. Sempre
gostava de ouvir o som da água caindo, me fazia relaxar um pouco a mente.
– O senhor ainda consegue ver ela
aqui? – Molly demonstra preocupação sobre mim, devido a falta que minha
falecida esposa fazia.
– Sim Molly. Sempre. – Fico em
silêncio.
– Eu estava vendo que o senhor
ainda guarda alguns objetos dela. Gostaria de se livrar delas?
– Sim Molly. O que você puder
fazer faça por mim. Estou impossibilitado de caminhar um quarteirão sozinho.
Apesar
de Molly ser aquela garota meiga de sempre. Eu media minhas palavras com ela.
Eu tinha medo que um dia eu falasse algo demais, e acabasse abrindo meu coração
para ela e estragasse a imagem de bom velhinho que ela ainda tem de mim. Ficamos
conversando coisas aleatórias. Logo ela preparou o almoço e comemos juntos e
como de costume ela volta para sua casa e me deixa sozinho.
Decidi
que iria dormir no quarto de baixo, já que estava quase impossível dormir no
meu antigo quarto do andar de cima. Minhas pernas já não aguentavam mais e Molly não podia ficar sempre fazendo esse sacrifício por mim. Estava
velho, e precisava tomar cuidado, não poderia cair da escada e deixar que minha
neta encontrasse um velho morto. Iria deixa-la traumatizada. Dormir no quarto
de hospedes me fez pensar a noite toda em minha vida, já que eu não estava
conseguindo dormir.
No
dia seguinte, acordei com barulhos pela casa, parecia que havia muitas pessoas
andando por todo lugar. Então decidi me levantar e dar uma olhada para ver o
que estava acontecendo. Quando saio do quarto, acabo descobrindo que não foi uma
boa ideia ter levantado esta manhã.
– Surpresa! – Grita minha neta
Molly, fazendo com que todos os familiares viessem até a porta onde eu estava.
– Surpresa! Feliz aniversaria!
Parabéns! – Era o que todos diziam com sorrisos largos entre os lábios.
A
verdade é que eu não estava muito feliz. Mas fingi felicidade. Eu não queria
estragar a boa vontade de ninguém por minha infelicidade, então fingi estar alegre com aquilo tudo. Agradeci a todos e quando me vi estava vestido e sentado
no jardim, na minha velha cadeira aconchegante, admirando a fonte que jorrava
água e que me trazia paz.
Fiquei
durante um tempo admirando a fonte até que uma criança, que eu não
lembrava bem. Parecia com um de meus bisnetos. Realmente não sabia quem era
aquele pequeno ser angelical que estava sentada ao meu lado me olhando com
grandes olhos azuis.
– O senhor é o aniversariante de
hoje! – Disse a menininha, que deixava seus olhos grudados em mim.
– Sim, é meu aniversario hoje.
Você parece feliz. – Respondi.
– O senhor não? Eu estou muito
feliz. O senhor me faz pensar umas coisas. – Diz a garotinha sorrindo.
– Que tipo de coisas? – Pergunto
curioso.
– Uma vez uma professora da minha
escola, me falou que quando eu crescer e ficar velhinha, eu poderei relembrar
coisas boas que já vivi.
– Sim. Isto é verdade. Poderá
lembrar-se de muitas coisas. Eu me lembro de bastante coisas. Sua professora
tem razão. Nossa mente é como uma câmera fotográfica, que registra os melhores
momentos da vida.
– O senhor não parece estar
tirando fotos nesse momento. – Afirmou a garotinha que neste momento estava
olhando ao seu redor, para a festa de aniversario que celebrava a idade daquele
velhinho.
– Você tem razão minha pequena. Talvez
a minha visão já não ajude muito. – Ri um pouco depois que disse isso, e
escutei risos da pequena garotinha.
– O senhor deve ter bastante
histórias divertidas para contar. – Retrucou a garotinha que parecia curiosa.
– Não muitas. A minha historia é
triste. – Depois que disse isso, abaixei minha cabeça.
– Então você pode me contar, e se
em algum momento eu rir, é porque sua historia não é triste. – Disse a garotinha que deixava seus olhos brilharem de entusiasmo.
– Qual seu nome minha pequena? –
Perguntei curiosamente.
– Rose Jewelers. Você poderia me
chama de Pequena Rose. – Sorriu a pequena garotinha.